Duas entidades já recorreram ao Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar o decreto do governo federal (nº 10.854) que alterou regras sobre vale-refeição para empresas no Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). Uma das ações foi ajuizada na segunda-feira, no mesmo dia em que foi publicada a Medida Provisória (MP) nº 1.108, que trouxe novas normas para quem não está inscrito no PAT.
Essa ação foi apresentada pela Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT), que representa as grandes do setor de vale-alimentação e refeição. No processo (ADI 7133), questiona quatro pontos do decreto de novembro de 2021. O primeiro é a redução do benefício fiscal aos participantes do PAT. O segundo, a instituição do “arranjo aberto” – que descentraliza os serviços de emissão do cartão eletrônico, de credenciamento da rede de estabelecimentos, gestão de contas e liquidação das operações.
Os outros dois pontos envolvem a possibilidade de portabilidade de saldos pelo trabalhador e alteração nas regras de pagamento dos vouchers alimentação. As maquininhas de cartão de uma determinada emissora terão que aceitar pagamentos por meio de outros cartões, dos concorrentes. Essas mudanças – à exceção da redução do benefício fiscal – entram em vigor a partir de maio de 2023.
A entidade alega que essas modificações (parágrafo 1º do artigo 174 e artigos 177, 182 e 186) seriam inconstitucionais. De acordo com a ABBT, o PAT não poderia ser alterado por meio de um decreto do presidente da República, uma vez que a competência para legislar sobre matérias financeiras, monetárias e fiscais, seria somente do Congresso Nacional, conforme prevê o artigo 48, incisos I e XIII da Constituição.
De acordo com o presidente do Conselho da ABBT, Alaor Aguirre, esses pontos precisariam ser alterados. Para isso, a entidade recorreu ao STF e pretende negociar com o Congresso Nacional, ao tratar da MP. Essas modificações, contudo, só valem para os participantes do PAT. Para ele, a “concorrência é altamente positiva e salutar e vem para trazer inovações”.
A ação da ABBT foi distribuída para o ministro Alexandre de Moraes por prevenção, uma vez que ele também é relator da ADI 7041, impetrada pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), em dezembro, apenas contra o artigo 186 do Decreto nº 10.854, que tratou da redução dos benefícios fiscais e já está valendo.
A Lei nº 6.321, de 1976, que instituiu o PAT, com o objetivo de incentivar as empresas a fornecerem alimentação aos seus funcionários, permitiu a dedução em dobro dos valores gastos com os benefícios de vale-refeição e alimentação, desde que não ultrapassem 4% do imposto devido no ano.
Contudo, o Decreto nº 10.854 reduziu essa dedução. A norma permite a aplicação do desconto apenas sobre a despesa com trabalhadores que recebem até cinco salários mínimos (R$ 5,5 mil) e, no máximo, o equivalente a um salário mínimo por empregado.
Desde novembro, quando o presidente Jair Bolsonaro editou o decreto, as empresas vêm recorrendo ao Judiciário e têm conseguido decisões favoráveis para continuar deduzindo os custos de forma integral. Existem inúmeras decisões na primeira instância e, pelo menos, dois Tribunais Regionais Federais (TRF) também se posicionaram a favor das companhias: o da 3ª Região, com sede em São Paulo, e o da 1ª, em Brasília.
Na opinião do advogado Alessandro Mendes Cardoso, sócio do escritório Rolim, Viotti, Goulart, Cardoso Advogados, sobre a limitação da dedução fiscal, a arguição é a mesma das ações individuais dos contribuintes, de violação à legalidade. “Já que se trataria de um decreto autônomo e não um decreto regulamentar. Ou seja, esse decreto estaria alterando as sistemáticas operacional e fiscal do PAT, que são matérias reservadas à lei”, diz. Para ele, contudo, há um contexto comercial muito forte na ADI da ABBT, que é mais relevante do que o tributário. “Uma forte disputa por esse mercado. A inicial da ADI deixa isso patente.”
Para o advogado Caio Taniguchi, sócio do TozziniFreire Advogados, a discussão sobre a restrição da dedução realmente tem bons precedentes a favor dos contribuintes. Já os outros pontos levantados pela ABBT, Taniguchi afirma não entender qual a desconformidade. “A intenção da ABBT até pode ser boa, mas não vejo nessas alterações qualquer prejuízo ao trabalhador.”
Essas alterações, acrescenta, não permitem qualquer desvio de finalidade, mas ao contrário tratam de maior fiscalização, uma vez que a MP nº 1.108 prevê punição para emissoras de vales e estabelecimentos comerciais no caso de os valores serem utilizados para outras finalidades. O artigo 5º trata de multas entre R$ 5 mil a R$ 50 mil, aplicadas em dobro em caso de reincidência ou embaraço à fiscalização. (Fonte: Valor Econômico – Por Adriana Aguiar)
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