Há muito os direitos trabalhistas no Brasil são rotulados como obstáculos para o desenvolvimento do país. Encargos trabalhistas são historicamente colocados na prateleira dos entraves para o crescimento econômico e a geração de emprego, contribuindo em boa parte o chamado “custo Brasil”.
Ainda assim, os direitos dos trabalhadores passaram intocados pelas últimas décadas, enquanto o país virava a página da ditadura militar, consolidava direitos sociais com a Constituição Federal de 1988, estabilizava a economia com o Plano Real e iniciava a redução da desigualdade social com políticas públicas de distribuição de renda e de promoção social. Esse cenário se reverteu. Mudanças estruturais como a revolução tecnológica, a globalização da produção de bens e serviços, o processo de desindustrialização global, que atingiu também o Brasil, acabaram por reconfigurar o mundo do trabalho de modo geral, afetando seu modo de se relacionar com o capital.
Em 2017, as crises política e econômica elevaram a taxa de desemprego a 13,9% e criaram o ambiente propício para lançar mudanças na CLT. Foi nesse contexto que a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) impulsionada pelo governo de Michel Temer foi aprovada pelo Congresso Nacional e entrou em vigor em 11 de novembro de 2017. Vendida sob o verniz da “modernização”, prometia reduzir o custo do trabalho ainda que ao preço de restringir direitos dos trabalhadores.
Dentre os mais de 100 artigos alterados, revogados ou criados na CLT, a medula da reforma é resumida em três profundas alterações na carta de emancipação econômica dos trabalhadores: prevalência do negociado sobre o legislado; fim da obrigatoriedade da contribuição sindical; e a criação de normas que impactaram na busca pela Justiça do Trabalho.
Negociado x legislado
O conceito do negociado sobre o legislado permitiu que acordos individuais, convenções ou acordos coletivos se sobreponham à lei no que diz respeito a várias questões, como jornada de trabalho, intervalo de almoço, plano de cargos e salários; participação nos lucros (todos previstos no artigo 611-A da CLT); horas extras, banco de horas; jornada 12×36 (artigos 59 e 59-A); parcelamento do período de férias (artigo 134, parágrafo 1º); e rescisão em comum acordo (artigo 484-A).
Vice-presidente do TRT-12 (Santa Catarina), Wanderley Godoy Junior acredita que a flexibilização das regras era necessária para amparar as especificidades do mercado. “Empregado e empregador, através de seus sindicatos, podem decidir questões que envolvem apenas determinado setor, em vez de se aplicar a regra geral da CLT. Um motorista não pode ter as mesmas regras que um empregado do comércio ou de um jogador de futebol, por exemplo.”
Em junho de 2022, o Supremo Tribunal Federal considerou constitucional, com repercussão geral, normas previstas em acordos coletivos que restrinjam ou limitem direitos trabalhistas, com exceção dos previstos na Constituição (Tema 1.046). No Tribunal Superior do Trabalho, empresas têm conseguido reverter decisões dos TRTs que negaram a validação das negociações coletivas. A jurisprudência fixada no TST, porém, é a de que as novas normas só devem ser aplicadas nos casos posteriores à data de vigência da Reforma Trabalhista (11 de novembro de 2017). O entendimento de que as normas criadas pela reforma só têm prevalência sobre casos posteriores à lei tem sido estendido na análise de recursos envolvendo tanto questões de direito processual quanto de direito material, como parcelamento de férias e honorários sucumbenciais.
Fonte: Exame
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