A falta de planejamento financeiro é uma das grandes responsáveis pelo alto índice de inadimplência no país. Um levantamento realizado pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) aponta que quatro em cada 10 brasileiros adultos (39,41%) estavam negativados em agosto de 2022 — o equivalente a 63,71 milhões de pessoas. No último mês, o volume de consumidores com contas atrasadas cresceu 10,13% em relação ao mesmo período do ano anterior.O crescimento se concentrou no aumento de inclusões de devedores com tempo de inadimplência de 91 dias a um ano (34,90%). O número de devedores com participação mais expressiva no Brasil está na faixa etária de 30 a 39 anos (24,03%): são 15,83 milhões de pessoas registradas em cadastro de devedores. Tal quantidade equivale a 46,29% do total de indivíduos desse grupo etário. O número de devedores segue bem distribuída entre os sexos: 50,88% de mulheres e 49,12% de homens.
“Renda baixa, inflação e desemprego altos, crise econômica mundial, falta de educação financeira são pontos que ajudam a explicar essa situação. Mesmo com uma renda menor, é fundamental se organizar para ter uma reserva e conseguir acomodar gastos urgentes em períodos difíceis”, destaca Merula Borges, especialista em finanças da CNDL.
Para que uma pessoa ou família consiga administrar bem seus recursos e não cair na inadimplência, é importante conhecer e aplicar conceitos básicos da educação financeira, conforme destacou o head de Investimentos da Corretora Nomad, Caio Fasanella. Segundo um estudo do Banco Mundial, menos de 40% dos brasileiros adultos são capazes de entender conceitos básicos sobre inflação, juros e riscos em investimentos. Por isso, um dos maiores vilões do endividamento brasileiro acaba sendo a falta de noções básicas de sua própria vida financeira.
“Muitas linhas de crédito são corrigidas por índices de inflação ou juros, como Selic ou Taxa Referencial, e é o que deixa a dívida do brasileiro mais alta e torna os juros de empréstimos maiores. Isso faz com que o refinanciamento fique cada vez mais caro e as famílias entrem na ‘bola de neve’ da dívida”, diz Fasanella.
Em agosto de 2022, cada consumidor negativado devia, em média, R$ 3.630,64 na soma de todas as dívidas. Cada inadimplente tinha, em média, 1,94 empresas credoras, considerando todas essas dívidas. Quase quatro em cada 10 consumidores (34,41%) tinham dívidas de valor de até R$ 500, percentual que chega a 49,24% quando se fala de dívidas de até R$ 1.000.
Em termos de participação, o setor credor que concentra a maior parte das dívidas é o de bancos, com 60,50% do total. A evolução das dívidas às instituições financeiras também teve destaque no último mês, com crescimento de 33,98%. Na sequência, aparece o comércio, com 13,13%, o segmento de água e luz, com 10,60%, e comunicação com 8,72% do total de dívidas.
A universitária Amanda Neri, 24 anos, está devendo, há um ano, cerca de R$ 5 mil para o banco. Seu nome acabou negativado depois de emprestar cheques para a mãe, que entraram sem fundos. “Não foi descontrole, no momento eu não podia pagar e o tempo foi passando e ficava a dívida. Por agora não me atrapalha em nada, mas eu queria comprar um carro mais para frente e, com certeza, isso vai me prejudicar”, contou a jovem, que está dependendo que sua mãe lhe pague para limpar o nome. “Nunca mais vou emprestar cheques ou meu próprio nome para terceiros, nem ficar prorrogando dívidas”, diz.
O presidente do SPC Brasil, Roque Pellizzaro Junior, alertou para a importância de os consumidores buscarem o máximo de informações a respeito das linhas de crédito oferecidas pelos bancos antes da contratação de um empréstimo. “Os bancos oferecem diversas linhas de crédito, mas aquelas de mais fácil acesso costumam ser também as mais caras. Quando as contas não estiverem mais cabendo no orçamento, a orientação é justamente procurar linhas de crédito mais baratas, ainda que isso signifique se deslocar até uma agência bancária ou falar com o gerente da conta. No final, esse movimento pode significar uma boa economia”, destaca Pellizzaro.
Um dos maiores responsáveis pelo endividamento é o cartão de crédito, principalmente o chamado juro rotativo, quando a operadora oferece a opção de pagar o chamado valor mínimo, deixando o restante da dívida para depois. Assim, a média anual do juro chega a 370%. Por isso os especialistas aconselham evitar ao máximo a opção de pagamento mínimo.
A administradora Janaína Esteves, 27 anos, está com o nome negativado por ter acumulado uma dívida no cartão de crédito após perder o emprego no final do ano passado. “Por ter várias coisas parceladas, fui pagando o mínimo enquanto podia, e, depois, acabou virando tudo uma bola de neve. Tive que seguir usando o cartão no início, por estar desempregada, e, desde fevereiro, não consegui mais pagar a fatura”, contou. O acúmulo das faturas com juros chegaram a mais de R$ 12 mil.
Há dois meses, Janaína foi chamada para um novo trabalho, e a primeira meta é conseguir limpar o nome. Para isso, disse, está aguardando um desconto no valor da fatura para trocar os juros do cartão de crédito por um empréstimo pessoal, que tem uma taxa de juros menor, e quitar a dívida à vista. “Os juros para o parcelamento são um absurdo, quando eles oferecerem, agora que eu voltei a ter renda, vou tentar conseguir um empréstimo para cobrir, é a única maneira de não me afogar em mais juros”, afirma.
Fonte: Correio Braziliense
Notícias: FEEB-SC