A relação dos trabalhadores com o vale-refeição não é nova. Mas ela está mais breve. O saldo do benefício dura em média 11 dias por mês, dois dias a menos do que em 2022. Isso significa que trabalhadores pagam metade das refeições do próprio bolso. Essa não é única mudança envolvendo a relação com o vale-refeição. A partir de 31 de dezembro de 2024, os trabalhadores poderão escolher a gestora do seu vale-refeição e vale-alimentação, desde que uma Medida Provisória (MP) aprovada na quarta-feira seja regulamentada pelo Poder Executivo. Se você é trabalhador, veja o que pode mudar em breve.
O vale-refeição e vale-alimentação estão previstos pelo Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) foi instituído pela Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976, e, atualmente, encontra-se regulamentado pelo Decreto n 10.854, de 10 de novembro de 2021. O objetivo do Programa é aumentar a qualidade da alimentação do trabalhador.
Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego, mais de 310 mil empresas participam do programa.
Atualmente, quem escolhe qual vale-refeição ou vale-alimentação o trabalhador recebe é quem assina a carteira dele. E toda vez que você paga um lanche ou um almoço, uma maquininha escolhida pela empresa do vale-refeição é usada para a operação.
O cenário de inflação e juros altos influenciam no tempo que o vale-refeição dura, como mostrou a pesquisa da Sodexo citada no início da reportagem. A Sodexo é uma das principais empresas deste mercado, que, junto da Alelo e Ticket, dominam o mercado. Juntas, as empresas detêm mais de 80% do mercado em termos do número de beneficiários. O PAT beneficia cerca de 24 milhões de brasileiros, dos quais 20 milhões recebem até cinco salários mínimos.
Na quarta-feira (09), a comissão do Congresso sobre a MP do PAT aprovou que o vale-refeição e vale-alimentação poderão ser utilizados em qualquer “maquininha” por meio do chamado arranjo aberto de pagamentos.
A proposta precisa ser aprovada por uma comissão do Congresso e depois pelos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado Federal até 28 de agosto para não perder a validade.
A portabilidade dos cartões de benefícios só valerá a partir de 2025. Quem não quiser mudar, não é obrigado. As mudanças só acontecerão com o trabalhador fazendo o pedido.
O relator da MP determinou no parecer quea mudança da gestora do cartão de benefícios será gratuita, a exemplo da portabilidade de conta bancária. Mas o governo federal ainda regulamentará quais serão as regras para isso. As regras de interoperabilidade e a portabilidade do PAT, em si, devem ficar com o Ministério do Trabalho e Emprego.
Se a MP for aprovada, a portabilidade do VR e do VA solicitada pelos trabalhadores pode ser aprovada ou rejeitada por acordos e convenções coletivas de sindicatos.
Se o texto da MP for aprovado como está, o Banco Central vai regular e ter responsabilidade sobre o tema, já que as transações de pagamentos do vale-refeição e alimentação devem ser integradas ao Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB).
Na verdade, em setembro do ano passado, foi sancionada a Lei 14.442, que modificou trechos da legislação que criou o programa e instituiu a portabilidade do cartão de benefícios de alimentação, mas a lei não foi regulamentada até o dia 1º de maio de 2023, por isso, voltou a ser tema de debates, especialmente entre as partes interessadas.
Há empresas que propõe maior flexibilidade para o funcionário escolher a operadora do seu cartão de benefícios, como a Zetta, associação que representa mais de 30 empresas de tecnologia que oferecem serviços financeiros digitais. Para a entidade, que representa empresas comoIfood e Caju, que já têm cartões de benefícios, além de Nubank e Mercado Pago, os prazos previstos agora, de mudanças só a partir de 2025, são pontos de atenção sobre as novas discussões. A abertura para que acordo coletivo entre sindicatos e empresas vete a portabilidade, o que retiraria do trabalhador o poder de escolha também preocupa, segundo nota da entidade.
“Ainda assim, o texto apresentado pelo Senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR), a ser votado ainda nos plenários do Senado e da Câmara, tende a modernizar o mercado e a permitir o aumento da concorrência e incentivar a redução das tarifas“.
Para a Associação de Consumidores Proteste, o prazo de regulamentação da portabilidade é distante, mas importante para todos que serão contemplados com o benefício.
“Como no caso dos serviços bancários ou de telefonia, a escolha de como utilizar o benefício cabe ao titular, que é o trabalhador/consumidor. Defendemos, portanto, que a regulamentação considere a livre escolha dos consumidores, ou seja, a portabilidade de benefícios de alimentação e refeição, e seja feita o quanto antes”, cita em posicionamento. “A Proteste está convencida de que a portabilidade do auxílio alimentação é benéfica aos trabalhadores (e fortemente demandada por eles)”, complementa.
A Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT), por sua vez, considera a portabilidade “uma mudança equivocada, inexistente em outros países, que desvirtua frontalmente o PAT, penaliza os estabelecimentos e fará com que o trabalhador seja o mais prejudicado, colocando a sobrevivência do benefício em perigo“.
A entidade defende ainda que a portabilidade ameaça a manutenção das empresas do setor que são de pequeno e médio porte com atuação regionais, “além de criar incontáveis complicações para as áreas de recursos humanos das empresas que concedem o benefício”. A nota segue sustentando que a “portabilidade causará aumento de custos que, no fim, acabarão sendo repassados ao próprio trabalhador”.
A Associação Brasileira de Recursos Humanos de São Paulo (ABRH-SP), reitera que a portabilidade criará “dificuldades praticamente insolúveis de gestão, provocará aumento nos custos, que serão repassados aos empregadores e estabelecimentos (restaurantes e supermercados), e os empregadores serão responsabilizados caso ocorram problemas no atendimento aos empregados”, explica Roberto Baungartner, CORHALE – Comitê de RH de Apoio Legislativo da ABRH-SP.
Baungartner levanta alguns pontos para exemplificar o aumento de custos. “Por exemplo, se o trabalhador puder trocar o seu cartão refeição quantas vezes desejar, a qualquer tempo, quem pagará pela emissão de um novo cartão? E, se a nova empresa tornar-se insolvente? Enfim, a ABRH espera que a portabilidade venha a ser revogada no plenário do Senado, e/ou na Câmara dos Deputados por onde ainda tramitará“, sustenta o especialista. (Fonte: Valor investe).